— É importante que jovens negros vejam um médico negro na TV, que é elegante, culto, educado, sabe o que está falando, e é respeitado por um branco milionário (Alberto, personagem de Antonio Fagundes) e pela família dele. Isso faz com que tenham consciência de que podem ser o que quiserem — frisa.
Jorge Lucas jamais se intimidou por ser o único negro da escola ou dos cursos:
— Fui criado na Zona Sul e sempre era o único negro nas turmas. Jamais abaixei a cabeça. A representatividade desse personagem me faz lembrar da minha avó, Hilda, que já morreu há muitos anos, mas sempre me dizia que ninguém era melhor do que eu.
Estar na pele de um doutor em “Bom sucesso” ainda trouxe ao ator a oportunidade de ter a sua irmã — Gloria Maria, médica especialista em cirurgia bariátrica — como a maior inspiração.
— Bebi na fonte dela (risos). Vejo minha irmã se emocionar com as histórias dos pacientes e levei essa humanidade para Mauri. Percebo o dom de todos os médicos com os quais eu convivi e convivo. Medicina é um sacerdócio — observa.
Uma missão que o artista tem exercido com louvor na novela das sete é tocar no tema morte, na vulnerabilidade da vida, sem perder a ternura. Esse aprendizado é mais um que esse trabalho, que chega ao fim no próximo dia 24, deixará de herança.
— Eu li e reli o livro “A morte é um dia que vale a pena viver”, de Ana Claudia Quintana Arantes, especialista em cuidados paliativos, para entender como trabalha um médico que trata de pacientes terminais. A morte anunciada de Alberto move a trama, mas essa é a única certeza que temos e ainda assim é tão difícil falar sobre esse assunto. Mas não precisamos fazer disso uma coisa pesada. É preciso valorizar a vida, o bem-estar, até nos seus últimos momentos. Por que o nosso fim não pode ser feliz? — questiona.
A estreita ligação entre médico e paciente na ficção também aproximou Jorge Lucas de Antonio Fagundes nos bastidores.
— Fagundes é um dos maiores atores desse país, é uma honra trabalhar com ele. É uma alegria contracenar com ele e com a mulher dele (a atriz Alexandra Martins, que interpreta uma enfermeira) — elogia.
Falando em felicidade, é nesse estado de espírito que Jorge Lucas se sente na Tijuca, onde mora há 20 anos.
— Nasci e fui criado em Botafogo, mas, aos 32 anos, comprei o meu apartamento e me mudei para a Tijuca. Comecei a transitar nessa área porque muitas produtoras de dublagem ficam no bairro. Em pouco tempo, percebi que a Tijuca tem tudo: comércio, padaria, metrô, supermercado, farmácia, academia, oficina mecânica, shopping, médicos… E o melhor: dá para fazer tudo a pé. É um bairro prático. Moro numa rua tranquila, arborizada, que tem uma vizinhança muito boa. Não penso em sair daqui. Sou tijucano de coração — derrete-se o morador do Largo da Segunda-Feira.
Responsável por aproximar o ator do bairro, a dublagem é uma das suas grandes paixões. Há 26 anos, ele é a voz de Ben Affleck no Brasil e ainda dubla personagens de outros astros internacionais, como Vin Diesel e Johnny Depp.
— É uma honra ter deixado minha marca vocal no imaginário de tantos brasileiros. Amo a dublagem, e, sem dúvida, esse trabalho me aproximou muito da Tijuca — diz o artista, que participou, diante das câmeras, de sucessos do cinema nacional, entre eles “Minha mãe é uma peça 2”, “Divã” e “Tropa de elite”.
Solteiro, Jorge Lucas vive sozinho em seu apartamento e garante que adora:
— Não preciso de bengala emocional. Como eternizou Oscar Wilde: “Amar a si próprio é o início de um romance para a vida inteira”. Esse é um aprendizado que, normalmente, vem com a maturidade. Sou caseiríssimo, amo minha família, tenho grandes amigos e uma irmã espiritual, por quem tenho um amor incondicional, que é a Carla Pompilio, mãe da minha filha.
Clara, a herdeira, de 23 anos, que cursa História na Universidade do Porto, em Portugal, é a razão de o coração do ator estar constantemente apertado.
— Morro de saudade da minha filha. Já fui visitá-la duas vezes, mas ano passado eu não consegui por conta das gravações da novela — diz.
Fonte: Jornal O Globo (Regiane Jesus –